O Equilíbrio entre Laicidade Estatal e a Valorização do Patrimônio Cultural Religioso no Brasil
O fenômeno religioso, multifacetado, entrelaça-se com a vida diária, permeando costumes, cultura, arte, política e Direito. Em relação à religião, o Estado classifica-se como confessional, laico e laicista ou ateu. O estado confessional adota uma religião específica em sua identidade e governança, muitas vezes com políticas baseadas em doutrinas religiosas. O estado laico garante a neutralidade em questões de fé, assegurando a liberdade religiosa e evitando o favorecimento de qualquer religião. Já o estado laicista ou ateu não apenas mantém a religião fora da governança, mas desencoraja a influência religiosa na sociedade, promovendo o secularismo ou o ateísmo como parte da política pública e da vida cívica. Desde a confusão entre o poder eclesiástico e o estatal em períodos coloniais até a consolidação da república e a adoção da separação entre Igreja e Estado, o Brasil tem trilhado um caminho rumo à laicidade. A maioria das constituições do Brasil, com exceção das de 1891 e 1937, mencionam a “proteção de Deus” em seus preâmbulos. A CR/88 foi um marco na consolidação dos direitos de liberdade religiosa no Brasil, reconhecendo a diversidade de crenças como valor cultural e assegurando direitos individuais e coletivos de prática e expressão religiosa, incluindo a liberdade de organização religiosa, assistência religiosa em instituições, ensino religioso facultativo e a objeção de consciência. Internacionalmente, os direitos das minorias religiosas são protegidos pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que defende a liberdade dessas minorias de exercerem suas culturas e práticas religiosas. Este acordo é apoiado por iniciativas da ONU que visam combater a intolerância e a discriminação baseadas em religião, assegurando a liberdade de identidade cultural das minorias. Diante dessas premissas surge uma indagação: é constitucional que o poder público subsidie obras de artes com imagens religiosas? O Poder Judiciário enfrentou recentemente dois casos emblemáticos, onde a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos tentou impedir os municípios de Aparecida e de São Sebastião de subsidiar obras de arte do escultor Pinna. Com relação a construção da escultura de Nossa Senhora Aparecida, o TJ/SP entendeu que “não houve constatação nos autos de configuração de violação ao preceito do Estado laico na adoção das medidas de revitalização cultural propostas pelo Município de Aparecida. O STF seguiu o mesmo entendimento quanto à construção de São Sebastião; tendo André Mendonça frisado que “… o Estado laico, tal qual previsto na Carta Republicana, não é um Estado laicista. (…) a estátua também traduz a identidade histórico-cultural do Município, cuja fundação e nomenclatura foram inspiradas no ícone de São Sebastião. (…) o monumento faz alusão ao próprio nome do Município, de modo que não se pode supor haver desconexão entre a obra e a cultura e a história da urbe.”, concluindo que “à memória histórico religiosa do Município, … não se mostra desproporcional quando cotejada com a laicidade estatal, notadamente, porque não desborda da discricionariedade da Administração.”. As expressões religiosas frequentemente transcendem a esfera da fé para se entrelaçarem com a cultura, a história e o tecido socioeconômico de uma nação. Em resposta à indagação, os monumentos discutidos são representativos não apenas de crenças religiosas, mas também constituem elementos valiosos da cultura e da identidade nacional. O incentivo à sua promoção vai além da religiosidade, alcançando a cultura, o turismo e a economia, reforçando a sua contribuição inestimável para a diversidade e riqueza do patrimônio cultural e histórico. baixe aqui o artigo publicado em 28/02/2024 baixe agora essa notícia em pdf clique aqui para ler a matéria na íntegra
O STF Garante Prisão Domiciliar a Pais e Responsáveis por Crianças e Pessoas com Deficiência
No Brasil a liberdade é a regra, sendo a prisão exceção, devendo aguardar o processo penal custodiado somente aqueles que prejudicarem as investigações, ou colocar em risco a garantia da ordem pública, econômica, conveniência da instrução criminal, aplicação da lei penal ou quando o estado de liberdade do indivíduo gerar perigo para a sociedade. A Constituição Federal assegura em seu artigo 5º, LXI, que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.” Antes da sentença penal condenatória, havendo necessidade, a requerimento da autoridade policial, do MP ou das partes o Juiz poderá decretar a prisão temporária ou preventiva, estando impedido, regra geral de agir de ofício. O artigo 318 do Código de Processo Penal, prevê a possibilidade de substituição da prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: – maior de 80 (oitenta) anos; – extremamente debilitado por motivo de doença grave; – imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos de idade ou com deficiência; – gestante; – mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos; e – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 anos de idade incompletos. O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que cabe a substituição da prisão preventiva pela domiciliar a homens ou mulheres que têm sob sua única responsabilidade a tutela de crianças menores de 12 anos e pessoas com deficiência, desde que preenchidos os requisitos legais. O STF ao expandir a interpretação legal entendeu que não deveria se aplicar apenas às mães a prisão domiciliar, pois assim o fazendo, acabariam sendo discriminadas às pessoas em condições especiais que não têm genitoras, ferindo, assim, o princípio constitucional da igualdade. O entendimento tem sido ampliado também aos condenados com trânsito em julgado. A lei de execução penal, prevê a substituição do regime de prisão domiciliar à mulher condenada, contudo, o Pretório Excelso tem firmado o entendimento de que à prisão domiciliar deve ser examinada sob a ótica do melhor interesse das crianças ou das pessoas com deficiência, podendo ser concedido de igual forma ao condenado homem, desde que seja o único responsável pelos cuidados do menor de 12 anos ou de pessoa com deficiência (Habeas Corpus nº 165.704). A proteção dada pela Suprema Corte às crianças e deficientes tem sido adotada de igual forma pelo Superior Tribunal Justiça. Em caso julgado no Habeas Corpus nº 401.303, que converteu a prisão em domiciliar, a corte entendeu que os relatórios médicos e psicossociais comprovaram que o condenado era imprescindível aos cuidados e proteção física e emocional de sua esposa que apresenta transtorno crônico bipolar e esquizofrênico, com incapacidade permanente para o trabalho, e de filho deficiente mental e físico. O tema é regulado ainda pela Resolução 62/20 do CNJ que recomenda a adoção de medidas preventivas por juízes e tribunais, entre elas a reavaliação das prisões provisórias de gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, diante da atual pandemia da Covid-19 no Brasil. Baixe aqui o artigo publicado em 25/05/2021 Baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra
O Stalking foi Criminalizado no Brasil
Com a evolução da sociedade surgiram novas condutas desvirtuadas, que contrariam regras e valores sociais, muitas vezes não previstas em lei como delito, mas embora inexistindo “rótulo” penal, acaba causando resultados nefastos ao cidadão. Quando isso ocorre, surge a necessidade de dar início ao processo de criminalização, ou seja, inclusão da conduta indesejada nas normas penais. Assim, é possível se afirmar que nem toda conduta vista como criminosa pela coletividade é criminalizada, ficando o cidadão desassistido das leis. É justamente o que ocorria com a perseguição habitual, onde pessoas eram constrangidas e coagidas por anônimos e por conhecidos sem que praticassem qualquer conduta criminosa. Há uma distinção considerável entre “olhar o perfil de alguém” e ser um “ciberstalker”. “stalking” ocorre quando determinada pessoa de forma contínua, persegue e/ou “vigia” de forma persistente outrem, importunando, incomodando, ou muitas vezes aterrorizando a vítima de forma alarmante. O ciberstalking não era considerado infração penal no Brasil até o advento da Lei 14.132/2021, ficando desassistidas incalculáveis vítimas ameaçadas em suas integridades físicas, perseguidas no ambiente do ciberespaço, onde os stalkers se amparavam na omissão legislativa para perpetuar no tempo o ciclo de violência. Recentemente fui procurado por um Oficial de Justiça lotado no Fórum Trabalhista de Guarulhos/SP, relatando que ao acessar a caixa de correio eletrônico institucional, deparou-se com um e-mail cujo título era “seu sistema foi atacado por um vírus, o dispositivo foi hackeado com sucesso”. No corpo do e-mail o criminoso exigia a quantia de $1100 dólares americanos, que deveriam ser transferidos a uma carteira de bitcoin, sob pena de ser divulgado dados sigilosos obtidos no equipamento da vítima. É comum no mundo atual práticas como estas, além de outras infrações penais como estelionatos (phishing), crimes contra honra, ameaças e extorsões; sendo incorporado no Código Penal o artigo 147-A que tipifica o stalking, ou seja, a conduta de perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. A conduta é punida com pena de reclusão, de 6 meses a 2 anos, e multa. A pena é aumentada de metade se o crime é cometido: – contra criança, adolescente ou idoso; – contra mulher por razões da condição de sexo feminino; – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. O crime se processa mediante ação penal pública condicionada a representação, ou seja, o delegado de polícia e o promotor de justiça somente poderão respectivamente, instaurar o inquérito policial e oferecer denúncia quando houver uma autorização expressa da vítima. Com o advento do novo tipo incriminador, foi revogada a contravenção penal de perturbação da tranquilidade. É importante frisar que a perseguição prevista na lei tem de ser reiterada, o que implica dizer que o novo crime é classificado pela doutrina como habitual, não sendo considerada infração penal um único ato, excluindo, portanto, a modalidade tentada. Às vítimas perseguidas por obsessivos ou criminosos contumazes, devem procurar uma delegacia de polícia, ministério público ou juiz para oferecerem a representação, autorizando o início da persecução penal ou procurar um advogado para que o faça, com o fim de buscarem a condenação dos stalkers e o possível ressarcimento dos prejuízos morais e materiais sofridos. Baixe aqui o artigo publicado em 06/04/2021 Baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra Baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra
A Fragilidade da Prova Testemunhal no Processo Penal
Vivemos um momento histórico no Brasil de tamanhas incertas. A economia está prestes a um colapso inimaginável, a saúde pública enfrenta o maior desafio de todos os tempos, devido o coronavírus e suas mutações; os políticos são tachados de forma generalista como corruptos, verdadeiros canceres da sociedade, sem qualquer separação do joio do trigo. O país está dividido em aqueles que amam o chefe do executivo federal e aqueles que idolatram o ex-presidente líder da esquerda. Diante desse medonho cenário social, será que o Poder Judiciário manter-se-á imparcial, exercendo o seu poder-dever de julgar os conflitos aplicando a legislação de forma justa, sem interferência da mídia ou clamor público? Esse é o maior desafio dos magistrados nos tempos vindouros. Antes mesmo da crise mundial, as sociedades contemporâneas já vinham flexibilizando direitos e garantias fundamentais e enrijecendo seus sistemas jurídico-penais. As alterações legislativas criadoras de um direito penal simbólico, rigoroso mas ineficaz, são impulsionadas por atos políticos voltados a atender os anseios da grande massa, manipulada pela mídia sensacionalista. E são justamente os “filhos” da classe social menos favorecida que acabam sofrendo os reflexos da rigidez da lei e dos aparelhos estatais destinados a investigar, acusar e julgar os cidadãos. Infelizmente os casos de erros judiciários na área penal é crescente no Brasil e tende a piorar devido o clima de insegurança pública que domina a sociedade, estimulando prisões cautelares desnecessárias em casos que bastaria aplicação de medidas cautelares do Art. 319 do Código de Processo Penal. Enfrentamos investigações precipitadas que se satisfaz com relatos não confirmados de testemunhas, com confissões advindas de tortura ou delações mentirosas que premiam o verdadeiro autor do delito. O pior, é que muitas das vezes esses elementos distorcidos de prova, acabam sendo suficientes para que promotores ofereçam denúncias infundadas e juízes “justiceiros” prolatem sentenças injustas. É imprescindível que o julgador se mantenha imparcial ao analisar o conjunto probatório, independentemente de quem seja o acusado ou o crime a ele atribuído, julgando com sensibilidade baseado nas provas produzidas e em sua livre convicção motivada. Erros ocorrem quando as condenações se pautam em testemunhos e reconhecimentos isolados. Ao absolver um acusado de roubo, condenado com base nas declarações de vítimas que diziam tê-lo identificado em uma foto apresentada pela polícia, o ministro Rogerio Schietti Cruz da Sexta Turma do STJ, relator do HC-598.886-SC, ressaltou que: – “Segundo estudos da Psicologia moderna, são comuns as falhas e os equívocos que podem advir da memória humana e da capacidade de armazenamento de informações. Isso porque a memória pode, ao longo do tempo, se fragmentar e, por fim, se tornar inacessível para a reconstrução do fato. O valor probatório do reconhecimento, portanto, possui considerável grau de subjetivismo, a potencializar falhas e distorções do ato e, consequentemente, causar erros judiciários de efeitos deletérios e muitas vezes irreversíveis.” A fim de evitar erros judiciários, os magistrados devem se atentar rigorosamente à harmonia do conjunto probatório, evitando condenações com base em provas duvidosas. Segundo pesquisa da Innocence Project, nos EUA aproximadamente 75% dos erros judiciários se devem a identificações equivocadas de testemunhas e vítimas no ato do reconhecimento. Em 38% dos casos, testemunhas oculares identificaram incorretamente o suspeito inocente. Baixe aqui o artigo publicado em 23/03/2021 Baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra Baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra