Medina da Rocha – Advogados Associados

O Direito Penal do Terror e a Sombra da Insegurança

Em um país marcado pela beleza de suas paisagens e a calorosidade de seu povo, o Brasil enfrenta, paradoxalmente, um cenário jurídico sombrio: o “Direito Penal do Terror”. Essa expressão, embora possa soar dramática, reflete uma realidade onde o medo e a insegurança são constantes, não apenas pelo crime, mas pela forma como o sistema de justiça penal responde a ele. O excesso e a espetacularização de punições muitas vezes se sobrepõem à busca por justiça e equidade. Nesse cenário, casos de prisões preventivas que se estendem por períodos indefinidos, julgamentos que parecem mais preocupados em responder ao clamor público e à pressão midiática do que em assegurar a justa aplicação da lei, e a imposição de penas desproporcionais tornam-se sintomas de um mal maior: a insegurança jurídica. Esta insegurança se infiltra no cotidiano dos cidadãos, gerando um clima de medo e desconfiança que transcende o temor do crime. Famílias veem-se desestruturadas pela ausência de entes queridos detidos sem julgamento definitivo, profissionais têm suas carreiras abruptamente interrompidas por acusações muitas vezes infundadas, e inúmeras vidas são marcadas pela estigmatização e pelo preconceito decorrentes de uma exposição. A manipulação das leis, com interpretações forçadas ou equivocadas para servir a interesses particulares, representa uma traição aos princípios fundamentais de justiça e igualdade. Quando a lei, que deveria ser o último reduto de proteção contra o arbítrio, torna-se instrumento de injustiça, o tecido social é erodido. Essa realidade é especialmente preocupante em um contexto onde a luta contra a corrupção e a criminalidade deveria ser pautada pela firmeza da lei aplicada de maneira justa e equitativa. No entanto, o que se observa são episódios em que a justiça parece se dobrar às conveniências do momento, ao invés de se ater aos preceitos de imparcialidade e integridade. O resultado é um cenário onde a impunidade e a arbitrariedade caminham lado a lado, minando a confiança nas instituições e comprometendo o desenvolvimento social e político do país. Há dois episódios recentes no Brasil que merecem atenção especial devido às controvérsias e críticas que suscitaram no âmbito do direito e da justiça: o chamado “inquérito do fim do mundo” e a operação “Tempus Veritatis”. O primeiro, assim apelidado pela amplitude quase ilimitada de sua abrangência e pela falta de especificidade nos seus objetivos, causou controvérsias, uma vez que foi iniciado de ofício, pelo STF; contudo, o sistema penal acusatório não autoriza que a condução da investigação penal seja feita pelo Judiciário, afrontando assim o artigo 129-I, II, VII, VIII e § 2º da Constituição, segundo parte da doutrina. Por sua vez, a operação “Tempus Veritatis”, embora possa ter sido concebida sob a premissa de buscar a verdade e a proteção do Estado Democrático de Direito, tem sido criticada pela forma como aplica o requisito da prisão preventiva. A falta de contemporaneidade — um dos pilares que justificam a necessidade de uma prisão preventiva para garantir a ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal — coloca em xeque a legitimidade dessas ações. Quando as prisões preventivas são decretadas sem a demonstração clara de sua necessidade imediata, questiona-se a proporcionalidade e a adequação dessas medidas, além de se alimentar um ambiente de insegurança jurídica e de possível injustiça. Diante desse cenário, torna-se imperativo refletir sobre o papel do Direito Penal e sobre os caminhos que a sociedade brasileira deve perseguir em busca de um sistema de justiça mais justo, equilibrado e eficaz. A superação do “Direito Penal do Terror” exige mais do que mudanças legislativas ou reformas pontuais; demanda uma revisão profunda de valores, princípios e, sobretudo, de práticas institucionais. Baixe aqui o artigo publicado em 21/02/2024 baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra

A Nova Era dos Direitos das Vítimas

A evolução dos direitosdas vítimas e a legitimação do assistente de acusação percorreram caminhos distintos nas tradições jurídicas da Civil Law e da Common Law, cada uma com suas peculiaridades históricas e dispositivos legais específicos. Este processo ilustra não apenas a mudança nas perspectivas jurídicas e sociais sobre a justiça penal, mas também um crescente reconhecimento da importância de proteger e dar voz às vítimas de crimes. Nos sistemas jurídicos mais antigos, a justiça era frequentemente administrada por meio de vingança privada, onde a vítima ou sua família tinham o direito (e às vezes o dever) de buscar reparação diretamente do ofensor. Este modelo, baseado na retribuição pessoal, gradualmente deu lugar a sistemas mais organizados onde o Estado começou a assumir o papel de administrador da justiça. No entanto, mesmo com essa transição, as vítimas permaneciam marginalizadas no processo judicial, sendo vistas mais como evidências de um crime do que como partes interessadas. A evolução dos direitos das vítimas ganhou destaque apenas no século XX, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, quando o foco nos direitos humanos começou a influenciar diversos aspectos da governança global, incluindo a justiça criminal. No cenário internacional, a proteção e os direitos das vítimas de crimes receberam atenção crescente, resultando na adoção de várias diretrizes e tratados significativos. Em 1985, a ONU editou a Declaração de Princípios Básicos de Justiça para Vítimas de Crime e Abuso de Poder, estabelecendo fundamentos para o acesso à justiça, reparação e medidas de recuperação para as vítimas. Posteriormente, em 1990, foram introduzidas as Diretrizes sobre o Papel dos Procuradores, incentivando que os interesses das vítimas sejam uma consideração primária no exercício das funções dos procuradores, garantindo tratamento com respeito e dignidade. O Estatuto de Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional em 1998, foi inovador ao criar o Fundo de Vítimas para auxílio e reparação, além de permitir que elas participassem diretamente do processo penal internacional. Além disso, a Convenção de Istambul, adotada em 2011 pelo Conselho da Europa, estabeleceu um compromisso robusto com os direitos das vítimas de violência de gênero, reforçando medidas de prevenção e combate à violência contra as mulheres e a violência doméstica. Esses instrumentos juntos formam um quadro internacional que reconhece a importância da justiça e do apoio às vítimas, marcando um progresso significativo na proteção de seus direitos e bem-estar. O Brasil tem avançado de forma gradual na proteção das vítimas e na atuação do assistente de acusação. Com as mudanças trazidas pelo pacote anticrime, o STF teve a oportunidade de superar a súmula 208 em um caso notório, permitindo que, com base em um recurso extraordinário do assistente de acusação, fosse ordenada a prisão de Monique Medeiros, mãe acusada por crimes contra seu filho, Henry Borel. A importância de o Brasil garantir os direitos das vítimas, dando legitimidade ao assistente de acusação, reside na essência de um sistema de justiça penal equitativo e eficaz. Ao fortalecer a posição do assistente de acusação, o país reconhece não apenas a necessidade de justiça em nome da sociedade, mas também assegura que as vítimas de crimes tenham voz ativa no processo penal. Isto é vital para que as vítimas possam buscar reparação e para que o sistema de justiça responda de maneira integral às suas necessidades. Adicione o texto do seu título aqui baixe agora essa notícia em pdf clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf Clique aqui para ler a matéria na íntegra

Um Grito Silenciado: Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes

Neste amanhecer, enquanto os primeiros raios de sol acariciam a cidade despertando-a, não podemos fechar os olhos para a urgência de refletirmos sobre um tema doloroso, mas essencial: a violência sexual que assombra a infância e a adolescência. Embora desconfortável, é imperativo expor as sombras que encobrem a realidade brutal enfrentada por inúmeras crianças e jovens em nosso País. As crianças deveriam ser envolvidas pela inocência, sonhos e alegria infindável de explorar o mundo. Lamentavelmente, há indivíduos que roubaram essa inocência de forma repugnante, deixando cicatrizes indeléveis e marcas emocionais profundas. A violência sexual contra crianças e adolescentes ​​desafia a compreensão humana, sendo um ato covarde que destrói vidas e dilacera famílias. Como cidadãos, temos a responsabilidade de levantar a voz contra esse mal insidioso que abala os fundamentos da nossa humanidade. No âmbito jurídico, o Código Penal estabelece medidas para combater a violência sexual. O artigo 213 tipifica o crime de estupro, punindo com reclusão de 8 a 12 anos, e em casos de lesão corporal grave ou se a vítima for menor de 18 ou maior de 14 anos, a pena pode ser aumentada. Além disso, aqueles que se aproveitam de sua posição hierárquica para obter vantagem sexual enfrentam penas de 1 a 2 anos de detenção, podendo ser aumenta se a vítima for menor de 18 anos. É crucial ressaltar que o CP considera estupro de vulnerável ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos, com penas de 8 a 15 anos de reclusão, podendo ser agravadas em casos de lesão corporal grave ou morte. As punições são aplicadas independentemente do consentimento da vítima ou de possíveis relações sexuais anteriores. O art. 218 do CP tipifica a corrupção de menores, com reclusão de 2 a 5 anos para quem induzir menores de 14 anos a satisfazerem a lascívia de outrem. Praticar atos libidinosos na presença de menores de 14 anos ou induzi-los a presenciar tais atos é punido com reclusão de 2 a 4 anos. Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou exploração sexual menores de 18 anos é punível com reclusão de 4 a 10 anos. As penas são aplicadas ainda a quem pratica atos libidinosos com menores de 18 e maiores de 14 anos, assim como aos proprietários, gerentes ou responsáveis ​​pelo local onde tais práticas ocorrem. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia, pode resultar em reclusão de 1 a 5 anos, com aumento de 1/3 a 2/3 se o autor crime de homicídio por alguém com relação íntima com a vítima, ou com o intuito de vingança ou humilhação. A pergunta persistente é: por que o silêncio diante desse flagelo social perdura? É chegada a hora de romper com a cumplicidade do silêncio, quebrar as correntes que aprisionam as vítimas nesse ciclo de dor. Denunciar é um ato de coragem, uma esperança de interrupção ao ciclo de abuso, oferecendo uma chance de cura para os feridos. É essencial considerar que a violência sexual não escolhe fronteiras socioeconômicas, culturais ou étnicas. Ela prospera na escuridão, alimentada pelo medo e pela vergonha. A omissão diante dessa tragédia é, por si só, uma forma de cumplicidade. Como membros desta sociedade, todos nós precisamos erguer a voz e dizer “basta”. É necessário desmistificar o tabu que envolve o tema, promovendo uma cultura de repúdio e apoio. Não podemos mais permitir que o silêncio proteja os perpetradores e perpetue o sofrimento das vítimas. É hora de nos unirmos como sociedade e declararmos, em uma só voz, que não toleraremos a violência sexual contra crianças e adolescentes. A denúncia é nossa arma mais poderosa, e juntos podemos criar um mundo onde a inocência seja preservada, os agressores sejam responsabilizados e as vítimas encontrem justiça e cura. Baixe aqui o artigo publicado em 14/11/2023 clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf

Proteção aos Órfãos do Feminicídio

No dia 31 de outubro de 2023, uma luz de esperança surgiu para os filhos e dependentes menores de 18 anos, órfãos em razão do cruel crime de feminicídio. A Lei 14.717/23, institui uma pensão especial para filhos e dependentes menores de 18 anos, órfãos em decorrência de homicídios praticados contra mulheres em razão de gênero. Ao que parece, o mens legis não apenas almeja fornecer sustento financeiro básico aos dependentes das vítimas, mas surge como um manifesto de empatia, reconhecendo a necessidade de apoio diante das situações desoladoras resultantes do feminicídio. Na trama dolorosa do feminicídio, onde as vítimas são silenciadas, essa legislação ergue-se como um murmúrio poderoso de solidariedade. Ao instituir uma pensão especial destinada aos filhos e dependentes menores de 18 anos que perderam suas mães para esse crime brutal, a lei registra a necessidade urgente de não apenas punir, mas também amparar. A métrica sensível exigida pela renda familiar per capita, igual ou inferior a 1/4 do salário-mínimo, revela que o legislador optou em amparar as camadas da sociedade mais vulneráveis, buscando amenizar os nefastos reflexos financeiros advindos com a eliminação da figura materna subitamente. Ao proporcionar um benefício equivalente a um salário-mínimo, a legislação sinaliza uma compreensão da necessidade de proporcionar estabilidade não apenas econômica, mas emocional. É um gesto que busca proporcionar às crianças, adolescentes e dependentes afetados pelo crime, um ponto de apoio em meio às águas turbulentas do luto e da incerteza. A concessão provisória do benefício, em casos em que há acusações graves de feminicídio, é uma resposta ágil às urgências que envolvem essas tragédias. Essa disposição reflete não apenas uma resposta legal, mas uma tentativa de consolo imediato para aqueles que, prematuramente, perderam a segurança e o carinho materno. No entanto, a flexibilidade dessa abordagem levanta questões práticas sobre a implementação eficaz, uma vez que detalhes sobre a entidade responsável pela gestão do benefício permanecem nebulosos. Além dos méritos proclamados pela lei, surgem algumas incertezas. A falta de clareza na definição dos beneficiários, ao incluir os “dependentes menores de 18 anos” sem critérios específicos, apresenta ambiguidades e a possibilidade de controvérsias futuras. A cláusula que permite a interrupção imediata do benefício em caso de inocência comprovada do autor, mostra um equilíbrio tênue entre a necessidade de proteção das vulnerabilidades e a preservação da presunção de inocência. É um lembrete de que, mesmo em meio à indignação justificada diante de atos tão atrozes, a justiça deve ser precisa e imparcial. Ao afirmar que as “despesas decorrentes do disposto nesta Lei serão classificadas na função orçamentária Assistência Social e estarão sujeitas a previsão nas respectivas leis orçamentárias anuais”, a norma parece sussurrar uma promessa vaga, sem oferecer uma solução concreta para a fonte de recursos. Um problema que, se ignorado, pode desencadear uma série de consequências no sistema protetivo, questionando sua sustentabilidade. A exclusão do benefício para aqueles que, em julgamento definitivo, são considerados condenados a atos infracionais análogos ao feminicídio, é uma medida que visa desestimular o assassinato de mulheres motivado em razão do gênero. É uma afirmação inequívoca de que a sociedade não tolera a replicação da violência, mesmo quando perpetrada por aqueles que, em teoria, deveriam ser protegidos pelo abraço compassivo da lei. A precaução também está intrínseca nas cláusulas da legislação. A disposição de que o autor, coautor ou participante do crime represente as crianças para fins de coleta e administração da pensão especial é uma barreira contra possíveis abusos ou manipulações do sistema por parte daqueles envolvidos no ato delitivo. A não retroatividade dos efeitos da lei pode gerar debates, mas sua aplicação imediata busca garantir socorro às vítimas de feminicídios ocorridos anteriormente, demonstrando uma preocupação real com a situação atual dessas famílias. A não acumulação do benefício com outros subsídios previdenciários e a reversibilidade da cota em caso de falecimento dos beneficiários demonstram uma preocupação com a efetividade e a justiça na distribuição desse amparo. No entanto, além da letra fria da legislação, há uma questão mais profunda e complexa: o compromisso coletivo de erradicar a violência de gênero. A Lei nº 14.717/23 é, sem dúvida, um farol ético em meio à escuridão, mas cada um de nós tem a responsabilidade de manter essa chama viva. Que esta lei não seja apenas um texto impresso, mas um eco incessante de um compromisso conjunto pela justiça, pela igualdade e pela erradicação da violência que ceifa vidas e dilacera almas. Baixe aqui o artigo publicado em 07/11/2023 clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf clique aqui para ler a matéria na íntegra baixe agora essa notícia em pdf